OBAMA NON É ALADINO


Por Nahum Sirotsky
(Folha OnLine, correspondente en Israel)
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Não se conhecem todos os detalhes do plano de paz de Obama para o conflito israelense-palestino. Como único jornalista brasileiro (era meu título, que escondia a ignorância de meus 20 anos) cobrindo as Nações Unidas, em 1945/1946, lembro os argumentos para a aprovação da resolução da partilha do que se chamava Palestina, entre um país árabe e outro judeu.
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Palestina que equivalia a cerca de um terço da província otomana do mesmo nome. O governo inglês, que recebera um mandato sobre a região no fim da primeira grande guerra, destacara cerca de dois terços para implantar o Emirado (Principado) da Transjordânia, atual Jordânia. Abdala, um dos dois irmãos beduínos que haviam apoiado o mitológico Lawrence Arábia numa revolta contra os turcos, fora feito Emir. Seu irmão mais velho, Faiçal, recebera o trono da Babilônia, hoje Iraque (m magnífico filme com a historia da revolta é o emocionante “Lawrence da Arábia”). Os irmãos tiveram morte violenta: Abdala foi assassinado por um árabe fanático na saída de preces de sexta-feira, dia santo muçulmano, na saída da mesquita de al Aksa, em Jerusalém; Faiçal foi massacrado com toda a sua família em revolução contra a monarquia. Ambos eram Husseni, descendentes do Profeta Maomé, filhos do derrubado rei de Medina pela tribo dos Saud, que hoje reina na Arábia Saudita de Meca, Medina e ricas reservas de petróleo.
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O presidente da 2ª Assembleia Geral das Nações Unidas, o gaúcho Oswaldo Aranha, anunciou o número 33, considerando aprovada a resolução da partilha. Foi há tanto tempo que às vezes me sinto pré-histórico. A decisão resultou de anos de tentativas para pacificar árabes e judeus. A coexistência parecia impossível. No Oriente Médio, todos os países são habitados e divididos entre minorias com tranquilidade imposta por autoritários. A língua brasileira fez do Brasil um só pais. Não é o caso do Oriente Médio, dividido entre religiões, seitas, etnias, línguas. A partilha logo resultou em guerras. Passados 61 anos, Israel aumentou de 500 mil a cerca de seis milhões de judeus e 1 milhão e 500 mil árabes, todos cidadãos israelenses. Mas, de forma geral, cada um vive em seu canto. Nos centros urbanos árabes, elevado percentual não fala o hebraico ou um hebraico precário. Uma minoria de judeus fala árabe. Árabes são isentos de certas obrigações dos judeus, como serviço militar. Existe um Estado de muitas culturas que não é um Estado multicultural como, por exemplo, os Estados Unidos.
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Há milhões de refugiados palestinos nos chamados territórios ocupados pelos judeus na guerra de 1967. Em Gaza, mais de 1 milhão e meio. Palestinos sem direitos políticos espalharam-se e vivem em países árabes como estrangeiros. A fórmula de dois países na mesma terra é a única solução possível. Os palestinos são um povo mais aberto à modernidade do que os seus irmãos árabes. Com apoio econômico e técnico, poderão criar um Estado com grande potencial de desenvolvimento. No Oriente Médio nasceram as três religiões monoteístas, os Mandamentos, a Bíblia, o Corão e obras literárias insuperáveis como as Histórias das Mil e Uma Noites. Obama pode ter a visão, mas não tem poderes mágicos. Tem presença e é um orador irresistível, mas não basta. Já investiu trilhões para salvar a economia das consequências de cínico vigarismo de grandes empresários. Mostrou a mesma coragem que o elevou de senador a presidente. Mas ainda não se pode dizer que venceu.
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Obama mandou George Mitchell à região para dizer que quer uma solução do conflito israelense-palestino nos próximos dois anos. Mitchell conhece bem a questão que tentou resolver em 2002. A vontade do presidente não basta. Digamos que, para começar, opte-se por tentar traçar as linhas de fronteira do país que quer ser Estado, mas não tem a infraestrutura burocrática de governo, o povo não é unido. Não é provável que Israel aceite recuar para as linhas de 42 anos atrás, com o risco de ter um país islâmico vizinho e inimigo. E compartilhar a soberania da cidade antiga de Jerusalém com um Hamas que não reconheceu o seu direto de existir numa região?
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Não duvido que o governo israelense atual confirme apoio à formula de dois Estados. Não há alternativa. O chefe do governo deve discursar domingo e talvez faça isto. Mas é um longo caminho cheio de obstáculos a serem superados. Dois anos? Chega a ser piada. Há milhares de anos os judeus rezam “paz para nós a todo o povo”. “Shabat Shalom”, Sábado de Paz, desejam uns aos outros no sábado, o sétimo dia da criação e, como escrito, de descanso de Deus. Mas Obama não é Aladdin

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