Adeus a Shimon Peres




Por Daniela Kresch
Tel Aviv - Rua Judaica

Sei que costumo falar muito do presidente israelense Shimon Peres, que deixa o cargo em duas semanas, nesta coluna. Não escondo minha admiração por seus discursos, suas ideias, seu comportamento, sua saúde aos 90 anos, seu passado no Partido Trabalhista e até mesmo seu histórico de brigas políticas – algumas até engraçadas. Já contei neste espaço, também, que o entrevistei várias vezes, sozinha e com outros jornalistas. E que sempre saí das entrevistas com um sorriso no rosto, feliz com o que ouvi, mesmo um tanto preocupada com os rumos do país que o próprio Peres não sabia quais seriam.

Peres viajou ao Washington, há alguns dias, para uma viagem de despedida do “Poder” na capital americana. Quantas vezes ele foi lá? Com quantos presidentes americanos se encontrou? Afinal, em mais de seis décadas na política, ele conheceu líderes do mundo todo desde os anos 50 do século passado. Quantas histórias terá para contar? Quantos segredos escutou? Quantas decisões ajudou a tomar em tantas capitais mundiais? Na viagem desta semana à capital americana, o presidente Barack Obama brincou com ele, perguntou qual é o segredo da sua longevidade.
Sem desdenhar de Reuven “Ruvy” Rivlin (É “Ruvy”, não “Ruby”, esclareceu a mulher dele outro dia...), substituir Shimon Peres será impossível. Não só porque Rivlin não tem a quilometragem, a estatura e a vivacidade de Peres. Também porque ele não sabe falar “mundês”. Shimon Peres é o melhor porta-voz de Israel em todos os tempos porque sabe falar politicamente correto, mas sem parecer que hipócrita. Ele sabe explicar ao público – que pode ser chinês, chileno ou norueguês – as posições de Israel, mas sempre enfatizando que o Estado Judeu quer a paz, quer viver sem conflitos com vizinhos e outros. Ele fala de Israel como um país moderno, amigável, interessado numa boa convivência com o mundo. E, acima de tudo, ele respeita, mesmo que não idealize, os eternos rivais palestinos (a liderança moderada, claro), deixando claro que o justo seria que houvesse dois Estados para dois povos vivendo lado a lado com segurança.

Quando Shimon Peres falar, o mundo escuta. E sempre dá um sorriso. A reza tripla no Vaticano, os encontros com artistas e atletas, com o Roberto Carlos, com o Ronaldo Fenônemo, com Messi... Peres é pop, no bom sentido da palavra.

Ruvy Rivlin, por outro lado, não sabe falar “mundês”. Ele fala “israelês”. Foi só escutar o que disse aos colegas de dois dos três jovens sequestrados pelo Hamas, dias depois do sequestro. Seu discurso foi ufanista, nacionalista ao extremo e ouso dizer, com pitadas raivosas. Não quero entrar em detalhes por falta de tempo e de espaço nesta coluna (que deve ser pequena para que os leitores não percam o interesse no meio, me disse uma vez algum especialista em internet). Mas Rivlin discursou como se fosse um líder da direita nacionalista, não como um presidente de todos os israelenses. É claro que os colegas dos sequestrados estão tristes e inconformados com o crime. Todos estão. Mas é aí que entra um verdadeiro presidente: que saiba acalmar, confortar e chorar junto, mas sem lançar atiçar ainda mais a divisão interna do povo. 

Em fim: adeus Shimon Peres. Saudades de antemão !

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