A região da Serra da Estrela, em concreto os municípios de Guarda, Trancoso e Belmonte, acolhe de 1 a 7 de Novembro, o primeiro Festival Internacional da Memória Sefaradita, um evento organizado pela Entidade Regional de Turismo da Serra da Estrela. Segundo o presidente deste órgão, Jorge Patrão, o “maior evento” realizado em Portugal sobre esta temática. São esperados, durante uma semana de trabalhos, cerca de 500 participantes, segundo Jorge Patrão, que refere haver várias universidades do mundo inteiro a procurarem saber mais sobre o evento. O programa inclui visitas e espetáculos evocativos do passado judaico, bem como um congresso que vai decorrer nos dias 2, 3 e 4 de Novembro no Teatro Municipal da Guarda, o palco principal desta atividade. Algo que não choca o presidente da Câmara de Belmonte, Amândio Melo, apesar de ser no seu município que reside uma das mais importantes comunidades judaicas do País, com cerca de 150 membros. “Estamos a falar de um evento regional. Só por si, Belmonte não tem força para ser falado no País e no mundo. Temos a plena consciência de que sozinhos não chegamos lá” afirma, dizendo que os três municípios onde decorre o Festival têm uma forte relação com o judaísmo, e que a principal diferença é que em Belmonte “não temos só o passado, também temos o presente”. É neste município que existe o único Museu Judaico do País, onde de resto o festival foi apresentado na quinta-feira, 7; é ali que há sinagoga; é ali que há rabino; e é ali que existe uma comunidade judaica organizada, que durante anos viveu na sombra, mas resistiu à Inquisição e hoje, de forma aberta e clara, pratica a sua religião. Por isso, para o presidente da Comunidade, António Mendes, ter um evento na Terra de Cabral seria impensável há anos atrás. “Não pensávamos que isto alguma vez fosse possível”, vinca o presidente da Comunidade Judaica de Belmonte, que diz que também “nem havia vontade da comunidade para divulgar a nossa história, pois tínhamos que nos esconder.” A abertura à sociedade que aconteceu gradualmente nas últimas duas décadas e agora é possível ver “na comunidade um prazer enorme em acolhermos este evento”, destaca António Mendes.
Uma história “mal aproveitada”Os trabalhos vão reunir estudiosos de vários pontos do globo para discutir a participação de judeus sefaraditas (nascidos na Península Ibérica) no processo de globalização, o papel do cônsul Aristides de Sousa Mendes na fuga ao holocausto, ou ainda o impacto da herança judaica no turismo. Estará ainda em debate o papel de Gracia Nassi, empresária judia portuguesa do século XVI que salvou centenas de cristãos-novos e marranos da morte e das perseguições anti-semitas. Gracia Nassi será homenageada durante o congresso no dia 3.Nos dias 5, 6 e 7 o programa passa por outros pontos de referência judaica em Castelo de Vide e Lisboa. “A região tem uma grande herança judaica. A aposta feita neste patrimônio culmina no Primeiro Festival da Memória Sefaradita Portuguesa”, explica Jorge Patrão, presidente da TSE. “É o maior evento do gênero no nosso País, acerca de uma história vastíssima, mal aproveitada turisticamente e mal explicada culturalmente”, acrescenta, com a expectativa de que se sigam outras edições da iniciativa, “mas sempre a crescer”. Este evento irá, segundo Patrão “ultrapassar as fronteiras da região”. “Será mais fácil crescer na segunda edição” acredita o líder da Turismo Serra da Estrela, que elogia o papel de Belmonte na preservação de uma identidade” que queremos mostrar que ainda existe em Portugal. Pena é que outros municípios não tenham conseguido fazer o mesmo” afirma. Embora diga que “outro municípios, como o Sabugal, estão a começar a fazer levantamentos neste âmbito e também temos reuniões marcadas para tentar avançar com uma rede de judiarias a nível nacional”, destaca Jorge Patrão.O Museu Judaico de Belmonte, as rotas de antigas judiarias na vila, na Guarda e em Trancoso, o azeite, vinho e queijos kosher produzidos na Beira Interior são algumas das marcas vivas na região destacadas por aquele responsável. Como referência, a TSE refere que, em 2009, o Museu Judaico de Belmonte recebeu 17 840 visitas, mais 16 por cento que no ano anterior. “Dez por cento dos visitantes eram judeus oriundos de países como Israel, Estados Unidos da América, Brasil e Canadá”, refere Jorge Patrão.
Cavaco Silva na Comissão de Honra
Da Comissão de Honra do Festival fazem parte Cavaco Silva, Presidente da República, Ehud Gol, Embaixador de Israel em Portugal, a ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas e rabinos de Nova Iorque e Londres. Também o Alto Comissário da ONU para os refugiados, António Guterres, já enviou mensagem de boa sorte para o evento.Presentes na apresentação, o comandante da Guarda, Joaquim Valente, lembrou o que era “a judiaria da Guarda há anos atrás e o que é hoje”, evocando o papel da autarquia na recuperação de alguns imóveis. “Tem havido uma onda de recuperação como nunca houve” assegura. Já o prefeito de Trancoso, Júlio Sarmento, revelou que o futuro Centro de Estudos Isaac Cardoso deverá ver as obras iniciarem-se este mês, ou em Novembro, sendo mais uma estrutura importante para a temática do judaísmo. “É um investimento de um milhão e 200 mil euros. Espero que se torne em mais um local de culto para os judeus” frisa, dizendo que é importante “dar escala” a esta oferta turística. Algo que, segundo Jorge Patrão, “não é fácil” tendo em conta que na região “não existe um aeroporto”.
Comentarios