CALÚNIA E RESPOSTA


Por Daniela Kresch

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Numa reportagem num jornal sueco foi o suficiente para causar um incidente diplomático entre Israel e Suécia. O jornal sueco Aftonblatet publicou uma matéria acusando o exército israelense de retirar órgãos de palestinos mortos. Para muitos, a matéria dá a entender que os soldados matam palestinos com o objetivo de comercializar seus órgãos. A acusação escandalizou os israelenses e levou o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu a exigir uma condenação oficial por parte do governo de Estocolmo. Netanyahu comparou a alegação do jornal à conhecida crença medieval segundo a qual judeus costumavam fazer pão ázimo com sangue de crianças gentias. A embaixadora da Suécia em Israel, Elisabet Borsiin Bonnier, chegou a divulgar um comunicado classificando a reportagem de “chocante e horrenda”, mas foi desautorizada pela chancelaria sueca. O governo sueco alega que não tem o poder de condenar a imprensa nacional, já que o país respeita profundamente a liberdade de expressão.Mas o chanceler israelense Avigdor Lieberman acusou o governo sueco de hipocrisia porque criticou a divulgação, por um jornal dinamarquês, de 12 caricaturas do profeta Maomé em 2006. Lieberman aproveitou para reclamar que a Suécia “não se envolveu” como deveria contra os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. O ministro também criticou o país vizinho, a Noruega, de “promover o antissemitismo” ao comemorar os 150 anos do nascimento do escritor Knut Hamsun, simpático a Hitler.

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Na reportagem do Aftonblatet, o autor, Donald Bostrom, repetiu acusações que já havia feito contra o exército israelense num livro que escreveu em 2001. Ele visitou uma aldeia palestina na Cisjordânia no começo dos anos 90 e presenciou a devolução do corpo de um militante do Fatah morto dias antes pelo exército israelense. O corpo teria sido operado. A família do palestino acredita que os israelenses “roubaram” o rim do militante. Bostrom decidiu reescrever a acusação depois que um judeu americano, Levy-Yitzhak Rosembaum, foi acusado de ter vendido ilegalmente um rim para um transplante. A reportagem de Bostrom é, obviamente, um primor de mau jornalismo. Trata-se de um caso de quase 20 anos atrás e de acusações feitas por palestinos contra soldados israelenses sem nenhuma prova. O autor da reportagem não ouviu Israel nem buscou provas nas quais basear sua matéria. O fundo antissemita é claro: ele ressuscitou o assunto depois que um judeu americano foi acusado de comercializar um rim. Quer dizer: se um judeu faz isso nos Estados Unidos, os soldados israelenses também devem fazer. Um absurdo.

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Mas a resposta do governo israelense também é de mau-gosto, principalmente a de Avigdor Lieberman. O chanceler não pode aproveitar a publicação de uma péssima matéria de jornal para criticar a atuação do governo sueco na Segunda Guerra, há mais de meio século. Não entendo como ele conseguiu fazer a ligação entre as duas coisas. Falar mal da Noruega também não ajuda na contínua busca israelense por aprovação e respeito internacional. Lutar contra a calúnia e o antissemitismo é necessário e legítimo. Mas com diplomacia e elegância.

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