O escritor Amós Oz fala de Israel e Palestina, o sonho do sionismo e como os políticos ouvem os artistas e depois esquecem tudo o que eles ouviram.
Unha entrevista de Joanna Chen Newsweek Web Exclusive
Feb 14, 2008
Tradução: Henrique Chagas / Eliane Nascimento
Amós Oz é um escritor israelense de fama internacional cujos trabalhos têm sido traduzidos para mais de 45 línguas. Em maio, com o roteirista Tom Stoppard e com o Vice-Presidente Al Gore, ele receberá o prêmio Dan David, totalizando três milhões de dólares. Oz, 69, que ensina literatura na Universidade Bem Gurion, no sudeste de Israel, foi citado pelos juízes por "retratar os eventos históricos e ao mesmo tempo enfatizar o individuo e a exploração pessoal do trágico conflito entre duas nações". Membro fundador do Movimento Paz Agora, Oz tem sempre estado à frente da dificuldade israelense referente à identidade e defende com fervor uma solução para os dois Estados. Ele recentemente deu uma entrevista à Joana Chen, da NEWSWEEK, na sua casa em Tel Aviv, sobre literatura, política e sobre as vozes dos mortos que não se vão.
NEWSWEEK: O que você acha que faz a sua escrita tão acessível para as pessoas do mundo inteiro?
Amós Oz: Eu acho que há algo universal no provincial. Meus livros são muito locais, mas de um modo estranho, eu acho que o quanto mais local, paroquial e provincial, mais universal a literatura pode ser.
Por que tão poucos livros seus tem sido traduzidos para o Árabe?
A tradução árabe é mais importante para mim do que qualquer outra. É aquela que eu me envolvo mais. Infelizmente, há uma parede de resistência nos países árabes. Muitos editores árabes não tocam em nada vindo de Israel, não importa se vem dos falcões [radicais] ou das pombas [diplomáticos]
O que você fez para remediar isto?
"De amor e trevas" é agora traduzido para o Árabe pela família de George Khoury, um aluno israelense palestino que levou um tiro na cabeça por terroristas que o confundiram com um judeu enquanto ele estava praticando seu "jogging" em Jerusalém. Eu estou muito tocado por isto e pela nobre decisão da família de tratar esse livro como uma ponte entre as nações.
Que papel você pensa que o passado desempenha na determinação do futuro desta região?
O passado quase domina esta região - não somente desempenha um papel. Eu acho que isso é uma das tragédias desta região. As pessoas lembram bem e muito. Ambos judeus e árabes carregam cicatrizes profundas, cicatrizes dramáticas.
Deveriam os dois lados deixar estas memórias de lado e se concentrar em corrigir o presente?
Nós podemos fazer isto. Nós podemos também usar nossas memórias como alicerce para o futuro. Nós podemos dizer, por exemplo, que essas especificas memórias traumáticas [servem como] uma lição em como se tratar outros povos, como nós deveríamos tratar nossas próprias minorias. Este é um modo de lidar com o nosso passado.
Você falou sobre um acordo de dor e ranger de dentes. Pode não haver um final feliz?
Não, eu não acredito num final feliz para este tipo de conflito trágico. Essencialmente porque há um conflito entre direita e direita. Qualquer acordo significará concessão; significará renunciar a algo que ambas as partes firmemente acreditam serem suas, e ambas as partes tem muitas boas razões para terem esta crença, então um acordo será como uma amputação para as duas partes. Não existem acordos felizes.
O que costumava ser um confronto local entre árabes e judeus tornou-se um assunto global.
Quanto eu era criança era muito similar ao conflito em Belfast: uma vizinhança contra outra vizinhança. Desdobrou-se num conflito de grande escala entre Israel e partes do mundo árabe, e infelizmente isso coincide com o conflito entre o ocidente e o Islã. Deixe-me imediatamente acrescentar que eu não acredito num choque de civilizações. Não é o Islã contra o Cristianismo. Não é o Oriente versus o Ocidente. São os fanáticos contra o resto de nós.
O Primeiro Ministro Ehud Olmert convidou você para sua casa no ano passado. O que vocês discutiram?
Não vou entrar em detalhes porque foi uma conversa privada, mas eu posso dizer que isso é uma prática bem comum neste país. Primeiros ministros convidam escritores e poetas para uma conversa reservada e perguntam-nos onde o país não deu certo. E eles admiram as respostas dos escritores e os ignoram completamente.
Você acha que os escritores ainda expressam a consciência social das pessoas?
Há uma grande expectativa na tradição judaica que o escritor e o poeta irá de algum modo ser o herdeiro do profeta. Lógico, nenhum escritor consegue isto, e até mesmo os profetas não foram bem sucedidos em suas épocas em mudar a cabeça das pessoas. Mas a expectativa existe.
Você se declarou contra a ameaça de invasão de Israel na faixa de Gaza.
Fazendo isso nós uniremos todo o povo palestino e talvez todo o mundo árabe ao lado do Hamas. Isso aumentará a opinião publica pelo Hamas. Se nós não formos cuidadosos, nós alcançaremos esta conseqüência. Ainda não aconteceu, mas poderá acontecer.
O que você acha que as pessoas de ambos os lados realmente querem?
A grande maioria dos judeus israelitas e a grande maioria dos árabes palestinos agora sabem que no fim das contas haverá dois estados, duas capitais em Jerusalém, nenhum grande retorno de refugiados para Israel e remoção maioria das colônias. Eles sabem disso, até mesmo as pessoas de ambos os lados que não gostam disso.
O Projeto Sionista ainda está vivo e funcionando?
Eu acho que é uma historia de sucesso, mas como todo sonho que torna realidade tem um gosto amargo. A única maneira de manter um sonho cor de rosa intacto é nunca tentar fazê-lo acontecer. Isto é verdade não só em criar uma nação. Isso é uma verdade em escrever um romance, plantar um jardim, por em prática uma fantasia sexual. O Sionismo aconteceu, e, portanto, é desapontador. Mas é sobre a natureza do Sionismo, sobre a natureza dos sonhos.
Você acha que a América está ajudando no processo de paz?
Sim. Eu gostaria de ver os EUA seriamente encorajando Israel a fazer as necessárias concessões para um acordo de paz com os palestinos. Encorajar Israel também quer dizer apoiá-los. Israel correrá grandes riscos renunciando os territórios ocupados, nunca algumas de suas defesas. A respeito disto, não somente os EUA, mas o mundo inteiro ajudariam se estendessem o máximo de empatia possível a ambas as partes.
O que você acha da ameaça iraniana?
Eu temo que daqui 10 ou 15 anos todo país que quiser terá meios de destruição em massa, então, a campanha contra o Irã é um caso perdido. Eu, pessoalmente, me preocupo mais com o Paquistão que como Irã. O Paquistão é um estado nuclear com um movimento islâmico muito poderoso, então fico mais nervoso com o Paquistão do que com o Irã.
Você tem literaturas favoritas?
Eu não tenho uma prateleira com obras primas amadas, mas Anton Chekhov está bem perto do meu coração, talvez o mais perto. Ele me faz rir e chorar, às vezes ele me faz rir e chorar ao mesmo tempo, o que é eu tentei fazer em "De amor e trevas": apagar a linha entre a tragédia e a comédia. Eu não mais acredito que a tragédia e a comedia sejam dois planetas diferentes. Elas são apenas duas diferentes janelas das quais nós podemos olhar a mesma paisagem das nossas vidas.
Como você planeja seus livros?
Eu não os planejo. É de repente. Eu ouço algumas vozes dentro da minha cabeça, vozes de personagens, vozes de pessoas. Eu não sei quem são essas pessoas, mas elas conversam dentro da minha cabeça, e eu não reconheço aquelas vozes inicialmente. Eventualmente, se elas permanecerem comigo o bastante eu me familiarizo com elas. E gradualmente as vozes se tornaram personagens, e o que elas fazem umas às outras é o mote. Mas sempre começa com uma assembléia de vozes.
Sua mãe cometeu suicídio quando você era criança. Você escuta a voz dela?
Às vezes sim. Eu muito freqüentemente escuto as vozes de pessoas mortas. Os mortos são muito importantes para mim.
E se uma pessoa não quiser ouvir as vozes de pessoas mortas?
Não ouvir essas vozes é perder parte de si, parte de sua vida. Quando eu escrevi "De amor e trevas" estava convidando os mortos para um café na minha casa. Eu disse para eles, "Sentem-se. Vamos tomar um café e conversar. Quando você estava vivo nós não conversamos muito. Nós falamos sobre política e assuntos atuais, mas nos não conversamos sobre coisas que importavam..... E depois que conversarmos e do café, você irá embora. Você não vai viver na minha casa. Mas você esta convidado para parar para o café de vez em quando". Este é o meu jeito certo de tratar os mortos.
Você escreveu que quando criança você queria crescer para ser um livro. É um livro mais duradouro que uma pessoa?
Foi uma questão de segurança pessoal. Eu estava com medo. Eu era uma pequena criança aterrorizada. Rumores estavam começando a chegar a Jerusalém no começo dos anos 40 sobre extermínio de judeus na Europa. O ar estava cheio de premonições sobre o mesmo destino aguardando os judeus em Jerusalém. Eu achei mais seguro crescer e me tornar um livro do que um homem, porque um livro, pelo menos, uma cópia de mim sobreviveria em alguma biblioteca distante em algum país distante.
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