OS LÍMITES DO INTERNACIONALISMO


Por Amitai Etzioni

Publicado na Rua da Judiaria



Numa reacção à falência do unilateralismo da Administração Bush, o internacionalismo está novamente em voga. E para relembrar como funcionam as Nações Unidas, a organização internacional por excelência, basta ver a forma como recentemente abordou o chamado “discurso de ódio”.O Conselho dos Direitos Humanos da ONU acabou de condenar de forma inequívoca um filme feito por Geert Wilders, um político holandês de extrema-direita, no qual ataca violentamente o Islão. O governo holandês fez tudo ao seu alcance para impedir o lançamento do filme. Nenhum canal de televisão da Holanda — ou de qualquer outro país — o quis transmitir. O que, por sinal, levanta sérias questões em relação à liberdade de expressão. Finalmente, o filme seria colocado online no site britânico liveleak.com. Como reacção, o Conselho dos Direitos Humanos da ONU aprovou uma resolução lamentando a utilização dos media “para incitar actos de violência, xenofobia ou intolerância e discriminação contra o Islão” ou outras religiões.Entretanto, a Al-Aksa, uma estação de televisão do Hamas, continua as suas transmissões ininterruptas para as pessoas de Gaza. A programação desta estação glorifica frequentemente os bombistas suicidas, os responsáveis pelo lançamento de morteiros Qassam e apela à destruição do Estado de Israel. Nesta estação, até os programas para crianças promovem o ódio contra o povo judeu — incluindo repetidas acusações de que os judeus usam o sangue de outros nos seus rituais e que foram eles os responsáveis pelos atentados ao World Trade Center.Repare-se que ao contrário do filme holandês, feito por um único indivíduo, a Al-Aksa é produto do esforço organizado de um movimento inteiro e do governo de Gaza, apostado em emitir tudo isto regularmente para milhares de crianças e jovens. Mas, mesmo assim, o Conselho dos Direitos Humanos da ONU não encontra aqui nada que o preocupe.Deixem-me primeiro dizer que o povo palestiniano têm bastante com que se preocupar, e que a situação em Gaza é horrível. No entanto, nenhuma destas preocupações — que devem ser atendidas o mais depressa possível — será servida se o Hamas continuar a exigir a destruição de Israel, ensinando aos seus jovens seguidores que odeiem cegamente os judeus.Eu próprio apontei a importância crescente das Nações Unidas como uma força principal na determinação do que a comunidade internacional considera legítimo. A ONU desempenhou um papel importante na classificação de quando a invasão a um país é legítima (como no Kuwait) e quando não é (como no Iraque de Saddam). As suas agências sociais ajudam com frequência pessoas por todo o mundo.No entanto, se a ONU quiser tornar-se uma parte ainda mais importante da nova arquitectura global, tem de se ofender mais por causa de actos de violência e menos com liberdade de expressão (quer pode chegar a ser ofensiva e revoltante) e ser, acima de tudo, muito mais imparcial. Ódio difundido contra os judeus não é melhor nem mais aceitável do que aquele dirigido contra os muçulmanos.

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